São Luís, a ilha-mundo: 413 anos de encontros culturais que moldaram a capital maranhense
Capital maranhense, tombada pela UNESCO, preserva tradições e costumes que atravessaram séculos e formaram uma das identidades culturais mais diversas do Brasil.
SÃO LUÍS - São Luís completa 413 anos como um retrato vivo da mistura de povos que moldaram sua cultura desde o início da colonização. Franceses, portugueses, indígenas, africanos e caribenhos deixaram marcas profundas que ainda hoje se revelam na arquitetura, na música, na religião, na gastronomia e até no modo de falar dos moradores.
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O título de Patrimônio Mundial da Humanidade, concedido pela UNESCO em 1997, consagrou o valor histórico da cidade. Mesmo em crescimento constante, São Luís mantém o diálogo entre passado e presente, preservando símbolos de sua formação multicultural enquanto se reinventa.
A breve presença francesa
Entre as curiosidades mais conhecidas sobre a capital maranhense está o fato de ter sido a única cidade brasileira fundada por franceses. Mas, segundo historiadores, essa narrativa tem um peso mais turístico do que histórico: a ocupação foi curta, durou apenas três anos, e a influência cotidiana da França foi menos marcante do que a dos portugueses e povos africanos.
Ainda assim, a presença francesa foi decisiva para registrar os primeiros contatos com os povos indígenas. Os missionários capuchinhos que vieram com a expedição francesa documentaram o idioma tupi, criando registros escritos que não existem em outras regiões do país. O padre Claude de Habeville relatou essas experiências no livro “História da missão dos padres Capuchinhos na ilha do Maranhão”, publicado em 1614.
“O grande patrimônio desse contato é que a gente não tem em nenhum outro lugar do Brasil uma documentação escrita tão vasta sobre esse contato. Os franceses podem não ter levantado casarões, mas documentaram tudo sobre os primeiros anos aqui”, explica Marcos Tadeu Nascimento, professor e mestre em História pela Universidade Estadual do Maranhão (Uema), ao g1 MA.
Após a derrota para os portugueses na Batalha de Guaxenduba, em 1615, os franceses foram expulsos, mas deixaram marcas permanentes: o nome “São Luís”, em homenagem ao rei Luís XIII, e a estrutura de fortes militares ao longo do litoral.
A marca dos portugueses na cidade colonial
Se a presença francesa foi breve, os portugueses deixaram um legado visível em cada esquina do Centro Histórico. Os sobrados coloniais cobertos de azulejos, as ruas estreitas de pedra e as igrejas erguidas ao longo dos séculos revelam a força da colonização lusitana.
A adaptação ao clima tropical levou os portugueses a inovar: os azulejos coloridos, além de adornarem fachadas, ajudavam a proteger as construções da umidade e do calor. Essa arquitetura única foi um dos principais fatores que garantiram o título de Patrimônio Mundial à cidade.
A religiosidade também foi profundamente moldada por Portugal. Igrejas como a Catedral da Sé, iniciada em 1690, carregam histórias que se misturam às lendas locais. Segundo a tradição, a vitória portuguesa sobre os franceses na Batalha de Guaxenduba teria sido alcançada com a intervenção de Nossa Senhora da Vitória, escolhida como padroeira do templo.
Herança africana
A história da capital maranhense não pode ser contada sem destacar a contribuição africana. Pessoas escravizadas trazidas da África durante o período colonial ajudaram a erguer a cidade e, apesar da opressão, preservaram tradições culturais que se tornaram símbolos de identidade e resistência.
Hoje, São Luís abriga um dos maiores quilombos urbanos do Brasil: o bairro Liberdade, com mais de 160 mil habitantes, concentra descendentes de comunidades que mantiveram vivas tradições ancestrais.
Essa herança está presente na religião, como o Tambor de Mina, que combina elementos africanos com o catolicismo. Os registros mais antigos remontam ao século XVIII. “Os povos que vieram para cá não chegaram sozinhos. Junto com portugueses e franceses, vieram africanos, turcos e pessoas de diversas partes do mundo, criando um caldeirão cultural que formou São Luís”, explica Marcos Tadeu.
A influência africana também se manifesta em expressões como o Tambor de Crioula, dança em homenagem a São Benedito, e na culinária, onde pratos como arroz de cuxá e sururu trazem ingredientes locais preparados com técnicas herdadas da cozinha africana.
Povos originários, primeiros habitantes da ilha
Muito antes da chegada dos colonizadores, povos indígenas já ocupavam o território que hoje abriga a capital maranhense. Seus costumes, saberes e tradições estão vivos no dia a dia da cidade.
A festa do Bumba meu boi, reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, é um exemplo dessa influência. Os personagens indígenas encenam rituais e reafirmam o protagonismo dos povos originários na história da região.
Muitos bairros também guardam nomes indígenas, como Maracanã, derivado do tupi Maraka’Nã, referência a uma ave típica da região.
A conexão com o Caribe e o ritmo do reggae
São Luís ganhou o apelido de “Ilha do Reggae” graças ao ritmo jamaicano que chegou ao Maranhão nos anos 1970 e se espalhou rapidamente. Mas a ligação com o Caribe é muito mais antiga: sítios arqueológicos revelam artefatos originários de países como a Guatemala, indicando contatos anteriores à chegada dos europeus.
Segundo pesquisas, marinheiros que aportavam no Porto do Itaqui teriam popularizado o reggae na capital, trocando discos por alimentos ou serviços. A dança coladinha, conhecida como “regar”, tornou-se marca registrada das festas e radiolas, transformando São Luís em referência nacional no gênero.
Uma cidade construída pela diversidade
A identidade de São Luís é fruto do encontro de diferentes povos e culturas. Franceses, portugueses, indígenas, africanos, caribenhos e tantos outros grupos formaram, ao longo dos séculos, uma cidade-mundo, onde tradições e modernidade convivem em harmonia.
Celebrar os 413 anos da capital maranhense é reconhecer que cada azulejo, cada ritmo musical e cada prato típico carrega um pedaço da história de quem ajudou a construir a “ilha do amor”.
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