PGR omitiu falas de Mauro Cid que contrastam com denúncia contra Bolsonaro
Na análise dos três últimos depoimentos dados em novembro e dezembro de 2024 por Cid —que chefiou a Ajudância de Ordens de Bolsonaro — é possível verificar que várias afirmações do tenente-coronel não foram apresentadas.
BRASÍLIA - A denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL) usa a colaboração de Mauro Cid como importante mecanismo de confirmação da suposta trama golpista, mas, ao mesmo tempo em que exalta pontos que incriminam o político, deixa de fora falas do ex-auxiliar que contrastam com a acusação.
Na análise dos três últimos depoimentos dados em novembro e dezembro de 2024 por Cid —que chefiou a Ajudância de Ordens de Bolsonaro — é possível verificar que várias afirmações do tenente-coronel não foram apresentadas, nem a título de contraditório, na peça assinada pelo procurador-geral, Paulo Gonet.
Cid mudou as suas declarações desde 2023, quando foi preso, o que é apontado pela defesa de Bolsonaro como matéria que fragiliza as acusações.
Em áudios que enviou a um interlocutor e que vazaram, chegou a dizer que estava sendo pressionado a relatar episódios que nunca ocorreram. Por outro lado, mudou em novembro a versão que vinha dando após ser confrontado por elementos de investigação e se ver ameaçado de perder a delação e ser preso.
A denúncia é elaborada com base nas investigações da Polícia Federal e chega a avançar em relação a algumas das conclusões policiais. Ela é composta também de vários elementos de provas, como quebras de sigilo e outros depoimentos.
Um dos pontos principais da denúncia é a existência do plano "Punhal Verde Amarelo", que trazia um cronograma de virada de mesa institucional que incluiria a morte do ministro Alexandre de Moraes e da chapa presidencial eleita, Lula (PT) e Geraldo Alckmin (PSB).
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A PGR diz na denúncia que Bolsonaro sabia do plano e o autorizou. Usa para isso, uma troca de mensagens entre Cid e o general Mário Fernandes, possível autor do documento. O general fala de uma conversa com Bolsonaro, que teria dito que "qualquer ação" poderia ocorrer até 31 de dezembro.
Bolsonaro nega.
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A denúncia, contudo, não inclui a versão de Cid, que nos depoimentos afirma não saber se Bolsonaro sequer tomou conhecimento do documento.
"Eu não tenho ciência se o presidente sabia ou não do plano que foi tratado, do Punhal Verde Amarelo, e se o general Mário levou esse plano para ele ter ciência ou não", disse Cid em depoimento dado à PF.
A PGR destaca a delação de Cid no ponto em que ele confirma que Moraes foi monitorado duas vezes, uma a pedido de militares que fariam parte do grupo operacional do Punhal Verde Amarelo e outra a pedido do próprio ex-presidente.
"Mauro Cid confirmou, ainda", escreveu Paulo Gonet, que "quem solicitou o monitoramento do ministro Alexandre de Moraes 'foi o ex-presidente Jair Bolsonaro'".
A denúncia deixa de fora, porém, que, na versão de Cid, Bolsonaro pediu o monitoramento não no contexto da operação de assassinato, mas porque estaria irritado por ter recebido a informação de que o ministro, seu desafeto, estaria se encontrando com o seu vice, Hamilton Mourão.
Outro ponto em que a denúncia colide com as falas de Cid, sem que essas sejam mencionadas, refere-se ao dia 15 de dezembro de 2022, data em que a operação de assassinato de autoridades teria sido colocada em prática e abortada.
A PGR destaca mensagens entre um dos militares e Cid, que estava fora de Brasília.
"Após a operação ser abortada, Rafale Martins de Oliveira enviou mensagem, às 21h05, via aplicativo WhatsApp, para Mauro César Barbosa Cid, afirmando 'Opa'. Cid respondeu, às 21h16, com 'vou mudar de posição'."
De acordo com a denúncia, evidenciou-se que ele [Cid] recebia informações atualizadas sobre o andamento das ações. Em sua delação, porém, o tenente-coronel assegura que estava em local de difícil sinal de telefonia celular e que não se comunicou com os militares.
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