
O desafio da consciência
Falamos sobre um dos problemas mais instigantes da Ciência: a consciência de computadores.
Um computador pode ser consciente? Esse é um tópico muito debatido em áreas como a filosofia da mente, a ciência da computação e a neurociência. Mas não existe uma resposta definitiva. Se nos referirmos simplesmente à capacidade de processar informações e responder a estímulos, então as máquinas já fazem isso. No entanto, se falamos de experiência subjetiva – a sensação de "como é ter uma experiência” – então a questão se torna muito mais complexa.
Alguns teóricos argumentam que, se pudermos simular completamente todas as funções do cérebro humano em um computador, ele deve, teoricamente, ter experiências semelhantes às de um ser humano. Outros rebatem falando que a simulação de um processo não necessariamente replica todas as propriedades do original, por exemplo, simular uma tempestade em um computador não o molha. Tampouco a imagem de uma montanha em uma tela é uma montanha...
A visão materialista defende que a consciência é um produto de processos físicos e, portanto, em teoria, um computador ou qualquer outra coisa poderia ser consciente se configurado corretamente. Por outro lado, o dualismo sustenta que a mente e o corpo são distintos e, portanto, replicar funções cerebrais em um computador não necessariamente conferiria consciência.
A revista Science divulgou que um coletivo de 19 peritos, que reúne cientistas da computação, neurocientistas e filósofos, propôs uma abordagem inovadora. Em vez de se basearem em um teste único e definitivo, eles elaboraram uma lista extensa que abarca vários atributos possivelmente indicativos da consciência em inteligência artificial, sem, contudo, confirmá-la de forma inequívoca.
Outros argumentam que a natureza determinística da computação tradicional, com base em bits e lógica binária, é inadequada para capturar a natureza da consciência humana. No entanto, novas formas de computação, como a computação quântica, podem desafiar essa visão, por ter natureza estatística.
"A Nova Mente do Imperador" é um livro de Roger Penrose, matemático e físico britânico renomado. Publicado originalmente em 1989, o livro aborda a relação entre a física quântica, a consciência e a inteligência artificial (IA).
Um dos argumentos centrais de Penrose é que a mente humana não pode ser totalmente replicada por um algoritmo computacional. Ele se refere ao famoso “Teorema da Incompletude de Gödel” para afirmar que há certas coisas que a mente humana pode entender intuitivamente, mas que um computador, baseado em algoritmos, nunca poderá alcançar.
Como dissemos, muitos pesquisadores de IA acreditam que a mente é, em essência, um programa de computador complexo, Penrose argumenta contra essa visão. Ele sustenta que a consciência e a compreensão humanas têm qualidades que não podem ser simuladas por uma máquina.
No início do século 20, havia um movimento, especialmente no Círculo de Viena, para formalizar toda a matemática. David Hilbert, um dos mais influentes da época, questionou se seria possível criar um sistema em que todas as verdades matemáticas pudessem ser dele derivadas. Gödel jogou um balde de água fria em 1931 respondendo negativamente.
O Teorema da Incompletude de Gödel é uma das realizações mais famosas e impactantes da lógica do século 20, por isso ele é chamado do maior lógico depois de Aristóteles! Este teorema estabelece limitações fundamentais para a capacidade de qualquer sistema formal de provar todas as verdades dentro desse sistema... Complicado, não?
Tentar organizar de uma forma melhor o que Gödel disse. Imagine uma biblioteca que contém todos os livros possíveis com exatamente 100 páginas. Se tentássemos encontrar um livro que listasse todos os outros na biblioteca, descobriríamos que ele não poderia existir! A mera tentativa de listar todos os outros livros consumiria mais de 100 páginas por si só. A mesma lógica serve para o computador: só que trocamos “100 páginas” por “100 linhas de códigos de programação”. Ou seja, um computador não pode se autorreferenciar assim como um livro não poderia conhecer a si mesmo, de acordo com Gödel.
Antonio Damasio, neurocientista cujo trabalho se concentra na neurobiologia da consciência, sugere que as emoções desempenham um papel crucial na tomada de decisões. Elas atuariam como bússolas, nos fornecendo feedback sobre nossas ações. Esta ideia foi explorada em detalhe em seu livro "O Erro de Descartes", onde ele discute casos de pacientes com danos em regiões cerebrais relacionadas à emoção e como isso afeta a tomada de decisões.
Por exemplo, pacientes com danos no córtex pré-frontal (CPF) muitas vezes apresentam mudanças notáveis em sua capacidade de tomada de decisões e comportamento social. O córtex pré-frontal é uma área crucial do cérebro envolvida no planejamento, tomada de decisões, controle inibitório, modulação emocional e muitos outros processos cognitivos de alto nível, como o aprendizado de novas funções. Uma das mudanças mais observadas é um aumento na impulsividade: pacientes com danos no CPF muitas vezes agem sem considerar as consequências de longo prazo de suas ações.
Outros estudiosos lembram que a experiência subjetiva é, certamente, o núcleo do conceito de consciência. Essa qualidade pessoal e íntima das experiências que parecem estar além da explicação objetiva. Por exemplo, podemos descrever um bacuri como uma fruta de casca amarelada e dura e núcleo com pequenos gomos brancos e um gosto doce com um leve azedinho no final. Mas para quem nunca provou bacuri, vai continuar sendo uma experiência desconhecida – esse é um dos argumentos principais das escolas védicas da Velha Índia sobre a necessidade de autoconhecer-se: ninguém lhe substituirá na luta pelo autoconhecimento e renovação interna – a consciência é subjetiva, pessoal e intransferível. Se ninguém pode fazer ginástica por você para lhe fortalecer os músculos, imagina a mente!
Enfim, a natureza da consciência e as experiências subjetivas são questões centrais em muitas áreas, e, até agora, não há hoje uma compreensão completa ou uma explicação definitiva para a ela. No entanto, ela é inegavelmente central para nossa identidade e experiência como seres humanos.
E os computadores, podem ser conscientes? Deixo a resposta para você.
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