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José Sarney é ex-presidente da República.
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Eleição majoritária

“Embora a eleição majoritária expresse um voto de confiança dado ao Presidente da República, ela não garante a qualidade do governo ou do próprio Presidente.”

José Sarney

Atualizada em 02/05/2023 às 23h38
 

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A questão da legitimidade do mandato nos cargos executivos é velha como a República. A Constituição de 1891 definia, em seu artigo 47, que “o presidente e o vice-presidente da República serão eleitos por sufrágio direto da Nação, e maioria absoluta de votos”.

 

Sabemos que logo foram adotadas as providências para que isso acontecesse: Prudente de Moraes foi eleito com 88% dos votos; Campos Sales, com 91%; Rodrigues Alves, com 93%; Afonso Pena, com 98%; o Marechal Hermes da Fonseca, com 65% — Rui Barbosa teve a maior votação de suas dez candidaturas, 35% —; Venceslau Brás, com 91%; Rodrigues Alves — que morreu antes da posse —, com 99%. Na eleição para completar o período, Epitácio teve 71% — Rui, 29%. Bernardes enfrentou a primeira reação séria, tendo somente 60% dos votos. Voltando as coisas ao eixo, Washington Luís teve 99,9%; Júlio Prestes, 60%, mas quem levou foi Getúlio Vargas, que teve a maioria de 40% mais os cavalos amarrados no obelisco.

A questão da maioria era secundária: valia o confiável — para os donos da eleição — voto a bico de pena, com direito a declaração para ser mostrada ao chefe. Passados os anos do caudilho, a eleição de dezembro de 1945 foi determinada por um decreto-lei (Lei no 9) para querer — “queremismo”, foi o nome do movimento — sua permanência. O golpe de outubro colocou em seu lugar o Ministro da Guerra, Gaspar Dutra, que teve 55% dos votos. A Constituição de 1946 manteve a fórmula da “Lei Constitucional” sem a exigência da maioria absoluta de votos.

Getúlio, que cooptara Dutra, fez-se candidato e obteve, em 1950, 48% dos votos. Como em 1930, tornou-se Presidente sem a maioria absoluta. A UDN, novamente derrotada com seu candidato, o Brigadeiro Eduardo Gomes, gritou “aqui d’el-rei”. Veio a tragédia de 1954. Em 1955, Juscelino Kubitschek vence Juarez Távora com 35% dos votos. Para governar, o Ministro da Guerra empenha sua espada de ouro. Mas perde, em 1960, para Jânio Quadros, que atinge 48% dos votos. 

Ruim da cabeça e doente do pé, Jânio renuncia e não volta nos braços do povo. Os militares golpeiam: nada de Jango. Se conformam com um parlamentarismo de circunstância. Jango aceita o compromisso e o desmonta com o plebiscito de janeiro de 1963. Monta ao mesmo tempo a arapuca de 1964. 

Cai nas minhas mãos convocar a Constituinte de 1987. Já a Comissão Afonso Arinos propõe o restabelecimento da regra da maioria absoluta com dois turnos, adotada na Carta de 1988. Asseguradas eleições democráticas com voto realmente secreto, é a fórmula que dá certo. 

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Embora a eleição majoritária expresse um voto de confiança dado ao Presidente da República, ela não garante a qualidade do governo ou do próprio Presidente. Esta depende de sua história pessoal, de seus princípios, de sua formação. O governo dependerá da consistência do apoio político que receberá.

O sistema presidencialista pode, assim, se resguardar com essa garantia, mas não evitará crises. Quem as evita — ou as constrói — é o Presidente da República. Para diminuir o impacto das crises — embora elas sempre possam acontecer — a solução é o parlamentarismo. Há muito estou convencido da necessidade dessa modificação constitucional. 

Uma mudança nos poderes presidenciais só pode ser admitida se começar a valer para os mandatos futuros. Seria absurdo pensar que um presidente eleito com a maioria absoluta dos votos aceitasse, como fizeram com Jango, uma diminuição de suas responsabilidades e o rompimento de seu juramento. 

Por outro lado, como já disse muitas vezes, é necessário, para o correto funcionamento das instituições democráticas, um novo sistema para as eleições parlamentares, com voto distrital-misto, e a reformulação da estrutura partidária. 

São grandes tarefas, mas o Brasil precisa que sejam enfrentadas. 

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