Bate bate na porta do céu
Meados de 2024. Sem nenhuma cerimônia já se fala novamente em uma nova reforma da previdência.
Meados de 2024. Sem nenhuma cerimônia já se fala novamente em uma nova reforma da previdência.
A última é datada de 2019. Não tem 05 anos.
Uma outra, em formato de minirreforma, a precedeu no início do mesmo ano. Mais precisamente em janeiro de 2019. E outra em 2015 também alterou importantes regramentos nos direitos previdenciários, como a pensão por morte, que deixou de ser vitalícia.
Bem-vindo ao palco do recorrente discurso sobre a reforma da previdência. Ou mal vindo, talvez.
Mal descansam os efeitos nefastos do aperto previdenciário promovido pela Emenda Constitucional n.103 - promulgada em 12/11/2019 - e parece que já se deram conta de que a prometida projeção de melhoria não era lá essas coisas.
O que parecia excepcional quando se falava em redução de direitos sociais em ocasiões como as mudanças nos direitos previdenciários virou rotina de conversas em qualquer banco de praça, padarias e escritórios. E sempre rompendo para o mesmo lado. Contenção de direitos sociais para garantir o pagamento e a sobrevivência do sistema a longo prazo.
A autofagia está batendo a porta! O sistema insiste em reduzir direitos a ponto de se questionar a sua própria razão de existir pagando valores insuficientes a mais de 70% dos seus beneficiários para manter a sua própria existência.
Parece que avançar nessa redução chegará ao caótico quadro de a previdência deixar de existir por si só e passar a se tornar um verdadeiro programa assistencialista, inclusive ao que a ela contribuem.
Muitos ainda não perceberam, mas esse filme já está nas prateleiras faz tempo.
O INSS paga atualmente cerca de 39,9 milhões de beneficiários, sendo quase 70% no valor de um salário-mínimo. Desse total, 06 milhões são de benefícios assistenciais.
Ou seja, o quadro escancara que as reformas anteriores não só apertaram os direitos previdenciários sob o argumento de saúde financeira, como se revelaram ter sofrido a previdência uma verdadeira migração de função institucional, em cuja nascente – na eufórica Constituição Federal de 1988 - era proclamada como substituidora de renda para se tornar hoje apenas um acalento remuneratório, garantindo um mínimo de renda ao segurado contribuinte até que ele, pela sorte de Deus, consiga voltar ao seu padrão de vida.
Paradoxalmente, uma coisa não mudou desde a CF/88. As discussões de socorro ao convalescente sistema previdenciário seguem na mesma bolha de sempre, limitada a uma percepção sinalagmática do jogo entre arrecadação e despesas públicas.
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O brasileiro nem se dá conta. E o poder público parece que também não. Mas a concessão de benefícios assistenciais no mesmo valor mínimo dos benefícios previdenciários tem estimulado toda sorte de informalidade no país, ultrapassando 40% da população economicamente ativa.
Eis aí um dos pontos. O estímulo comportamental que a legislação dá ao segurado, que deixa de contribuir porque sabe que aos 65 anos terá direito a um benefício assistencial de mesmo valor que se tivesse contribuído para a previdência durante 20 anos sobre um salário-mínimo. Melhor guardar o pouco que tem!
Resultado, desestímulo comportamental na arrecadação tributária, que se alastra ano a ano elevando as estatísticas do trabalho informal do país, que na prática soma a renda do assistencialismo e a do trabalho não declarado.
Quer piorar? Defende-se agora uma espécie de desindexação dos benefícios previdenciários ao salário-mínimo.
Anunciam nas manchetes errado, dando a entender que os benefícios previdenciários são indexados ao salário-mínimo. Isso não existe desde a CF/88, que proíbe categoricamente essa vinculação no art.7º, IV.
Na verdade, se defende que na prática os benefícios previdenciários possam ser pagos abaixo de um salário-mínimo, permitindo que aqueles que recebem pensões e aposentadorias nesse valor tenham reajustes abaixo de um salário-mínimo nos próximos anos. Suicídio arrecadatório à vista, temperado agora com o total abandono da frutuosidade do sistema previdenciário. Falência dupla, da arrecadação e dos direitos previdenciários sociais.
Do outro lado se fala em aumento de cobrança de tributos das empresas. Aí a balança pesa para o empresário, que além de esgotado de tanta tributação desestimulante, se vê na iminência de desistir de sua atividade econômica. É que o tributo, assim como direito penal, tem uma forte influência no comportamento da sociedade.
E a discussão não sai dessa gangorra, a depender do grau de retórica e convencimento de quem possui o lugar de fala.
Por enquanto, poucos acenos à previdência privada, que silenciosamente tem sido a saída para muitos outros países, e muito menos ao comportamento contributivo do trabalhador.
A tentativa mesmo é encontrar um culpado, seja o contribuinte, seja o segurado e seguir o manual do aperto para um dos lados.
E enquanto isso, uma leva de não previdentes deve se socorrer batendo na porta do céu.
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