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Filme “A Natureza das Coisas Invisíveis” fala sobre luto através do olhar das crianças

Longa 'A Natureza das Coisas Invisíveis' de Rafaela Camelo explora luto por três gerações e se destaca em festivais como a Mostra SP, Mix Brasil e Gramado.

Na Mira, com informações do Portal O Tempo

A Natureza das Coisas Invisíveis fala de luto através das crianças.
A Natureza das Coisas Invisíveis fala de luto através das crianças. (Reprodução/Vitrine Filmes)

BRASIL - A presença da morte esteve em evidência nos principais festivais de cinema deste ano. O tema rondou Gramado, marcou produções premiadas da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e atravessou parte das obras exibidas em Cannes. Entre vampiros, distopias e dramas íntimos, a conversa sobre a finitude se tornou quase um eixo invisível conectando diretoras e diretores ao redor do mundo.

Nesse movimento, surge “A Natureza das Coisas Invisíveis”, primeiro longa da cineasta Rafaela Camelo, que parte exatamente do ponto em que a vida termina. A obra acompanha três gerações de mulheres atravessadas pela perda. Durante as férias de verão, a pequena Glória passa os dias no hospital onde a mãe trabalha e ali conhece Sofia. Entre rotinas de pacientes e a despedida de Benedita, bisavó de Sofia, as duas meninas se aproximam enquanto descobrem o que significa encarar a morte quando o mundo adulto tenta blindá-las.

“Entendi que queria falar sobre finitude e luto”, explica Camelo. A ideia surgiu antes da pandemia, mas o período de isolamento redefiniu a forma como a diretora encarava o tema. “O tom do filme nasce desse período em que não dava para se despedir. Perder alguém sem processar a dor mexe com a forma como entendemos a morte.”

A Natureza das Coisas Invisíveis

A recepção do filme confirma o impacto dessa abordagem. “A Natureza das Coisas Invisíveis” foi destaque em festivais dentro e fora do Brasil: venceu o Coelho de Ouro de melhor longa-metragem brasileiro no Festival Mix Brasil 2025, garantiu o Coelho de Prata de melhor interpretação para Laura Brandão e Serena, e levou dois prêmios na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo: o Prêmio da Crítica e o Prisma Queer de Melhor Filme Brasileiro. Em Gramado, ainda somou três troféus, entre eles o de melhor atriz coadjuvante para Aline Marta Maia.

A obra também dialoga com outras produções que abordam a morte em diferentes chaves narrativas. Em Berlim, “Mickey 17” colocou Robert Pattinson em um ciclo eterno de renascimentos; em Gramado, “Sonhar com os Leões” começa com um diagnóstico de câncer; e o cearense “Morte e Vida Madalena”, exibido na Mostra SP, carrega o tema já no título.

A morte como parte do cotidiano

Camelo evita transformar o luto em trauma ou espetáculo. A narrativa o insere como parte da engrenagem da vida. “Ritualizar a despedida é uma forma de reorganizar o mundo”, diz a atriz Camila Márdila, que interpreta a mãe de uma das crianças. “A pandemia tirou isso da gente. O longa reencontra a ideia de que lembrar alguém é uma forma de trazê-la de volta.”

A própria arquitetura do filme incorpora essa lógica. No meio da história, há uma quebra repentina: o hospital desaparece e a trama se desloca para o interior de Goiás, onde as famílias, ao fim das férias, tentam reorganizar as relações diante da perda iminente. Em sua primeira cena no campo, com trilha de Milton Nascimento e luz quente, o longa praticamente renasce.

“Queria uma metáfora de morte e vida dentro da própria forma”, explica a diretora.

Transgeneridade sem espetáculo

A obra também se destaca pela maneira como aborda a transgeneridade de Sofia, que nasceu Bento. A diretora evita a lógica da “revelação” dramática. “Era importante não ter essa informação logo de cara. Primeiro a gente encontra a personagem, só depois descobre algo sobre ela”, diz Sofia Camelo.

Quando Sofia conta que é uma menina trans, nada extraordinário acontece. “Queria trazer essa banalidade. O conflito dela não é ser trans. É a partida da bisavó. Não fazer disso o centro é uma escolha política.”

Espiritualidade e presença dos que se foram

Outro elemento central é a espiritualidade sutil do longa, sem vínculo com doutrinas específicas. Sofia Camelo fala em “coabitação de presenças”: a forma como lembranças ocupam espaços e como os mortos seguem tocando discretamente o cotidiano.

Para a atriz Larissa Mauro, que vive a mãe de Glória, sua personagem também atravessa um processo íntimo de renascimento. Ao deixar o hospital e entrar no campo, ela cruza uma fronteira semelhante à que move a narrativa. “As linhas dela com a filha mudam. O corpo se reorganiza e as conversas se abrem”, afirma.

Veja trailer de “A Natureza das Coisas Invisíveis”

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