BRASIL - A repactuação do processo de reparação dos danos causados no rompimento da barragem da mineradora Samarco ainda não seduziu boa parte dos municípios atingidos. Firmado no ano passado e homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o novo acordo foi negociado em busca de soluções para impasses que persistem após mais de 9 anos da tragédia. Entre diversas medidas, foi prevista a transferência de recursos para as prefeituras desses municípios.
Mas havia uma condição: desistir da ação de reparação de danos que tramita na Justiça inglesa. No entanto, até o momento, apenas quatro tiveram a desistência confirmada. Os outros 42 continuam buscando a reparação dos danos fora do Brasil.
O acordo de repactuação deu às prefeituras 120 dias para decidir sobre a adesão do município. A contagem do prazo se inicia com a data da homologação pelo STF, que ocorreu em 6 de novembro de 2024. Portanto, a decisão pode ser tomada até o dia 6 de março. Diferentes municípios têm manifestado tendência de se manterem focados no processo que tramita nos tribunais ingleses.
A prefeitura de Ouro Preto (MG) está entre as que, até o momento, não aderiram à repactuação. Em nota, o município sustenta que "o acordo não reconhece os prejuízos sofridos no território e, por isso, não promove a reparação necessária". O texto também registra que a administração municipal acompanha de perto os desdobramentos do processo na Inglaterra.
Rompimento da barragem
A barragem que se rompeu no dia 5 de novembro de 2015 se localizava na zona rural do município de Mariana (MG), em um complexo minerário da Samarco, uma joint venture que tem como acionistas a anglo-australiana BHP Billiton e a brasileira Vale. Na ocasião, cerca de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos escoaram pela Bacia do Rio Doce, até a foz no Espírito Santo. Dezenove pessoas morreram, dois distritos - Bento Rodrigues e Paracatu - foram completamente destruídos e houve impactos às populações de dezenas de municípios mineiros e capixabas.
O julgamento na Inglaterra havia sido paralisado em 20 de dezembro para o recesso de fim de ano e foi retomado na última segunda-feira (13). Nele, cerca de 620 mil atingidos, além de municípios, comunidades indígenas e quilombolas, empresas e instituições religiosas, processam a BHP Billiton, que tem sede em Londres. São listadas perdas de propriedades e de renda, aumento de despesas, impactos psicológicos, impactos decorrentes de deslocamento e falta de acesso à água e energia elétrica, entre outros prejuízos.
A ação, que tramita desde 2018, entrou na etapa de julgamento do mérito em outubro do ano passado. Ao final das audiências, que deverão se estender até o mês de março, os juízes irão determinar se há ou não responsabilidade da mineradora. Em caso positivo, o tribunal passará a analisar os pedidos de indenização individual, o que poderá se arrastar até o fim de 2026.
Há um acordo entre a BHP Billiton e a Vale para que, em caso de condenação, cada uma arque com 50% dos valores fixados. O escritório Pogust Goodhead, que representa os atingidos, pleiteia uma indenização a ser paga pelas mineradoras em torno de R$ 260 bilhões. Caso a sentença seja condenatória, os valores seriam pagos à vista.
Já no acordo de repactuação, as mineradoras se comprometeram a destinar R$ 100 bilhões em dinheiro novo. Deste total, R$ 6,1 bilhões seriam direcionados a 49 municípios, em parcelas anuais que se estendem por 20 anos. São listados especificamente os valores para cada um deles. A forma como os recursos foram divididos foi definida com base em proposta formulada pelo Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (Coridoce), composto exatamente por municípios atingidos na tragédia.
Diferentes administrações, no entanto, consideram que o montante repartido é insuficiente. Essa é uma queixa do prefeito de Mariana, Juliano Duarte. O município faz jus à maior quantia, de R$ 1,22 bilhão. Duarte, no entanto, já se manifestou em diferentes ocasiões que considera o valor baixo diante dos danos suportados. Ele critica também o longo parcelamento, fazendo com que os valores cheguem a conta-gotas.
A Samarco informa em nota que 12 municípios já aderiram ao novo acordo e que, em dezembro, foram realizados repasses que somam R$ 26,8 milhões. Os recursos recebidos devem ser destinados para iniciativas variadas envolvendo temas variados fomento à agropecuária, melhoria de sistema viária, gestão de cultura e turismo, educação, saneamento e saúde. Há, no entanto, diferenças entre a lista dos municípios atingidos reconhecidos pelo acordo e a relação daqueles que estão incluídos no processo inglês.
Córrego Novo (MG), Sobrália (MG), Conceição da Barra (ES) e São Mateus (ES) são os quatro que já tiveram a desistência confirmada no tribunal estrangeiro. Além deles, a Samarco confirma houve a adesão à repactuação foi formalizada por Ponte Nova (MG) que também buscava reparação na Inglaterra. O escritório Pogust Goodhead reitera que, até o momento, só recebeu quatro pedidos de desistência. Procurada pela Agência Brasil, a prefeitura de Ponte Nova (MG) não retornou ao contato para esclarecer se estava deixando o processo inglês.
Além dos cinco municípios, sete que já aderiram à repactuação - Iapu (MG), Santana do Paraíso (MG), Marliéria (MG), Anchieta (ES), Fundão (ES), Serra (ES) e Linhares (ES) - não figuravam na ação que tramita na Inglaterra. "A Samarco segue em diálogo com os demais municípios para viabilizar novos repasses e assegurar uma reparação definitiva dos danos provocados pelo rompimento", acrescenta a nota divulgada pela mineradora.
Prazo máximo
Uma parte dos municípios pretende usar todo o prazo disponível para avaliar o cenário e tomar a decisão. De um lado, há expectativa de que a Samarco possa ser convencida a melhorar as condições previstas no acordo de repactuação, o que mudaria o cenário. De outro, também há conversas com o escritório Pogust Goodhead para uma melhor compreensão do prognóstico em torno do processo inglês.
O prefeito de Colatina (ES), Renzo Vasconcelos, é um dos que ainda avaliam as opções. Em resposta à Agência Brasil, a prefeitura informou que o prazo limite de 6 de março deve ser usado para tomar a decisão e que "recebeu, nesta semana, representantes do escritório inglês e das empresas envolvidas no rompimento da barragem".
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