Francisco Dornelles
A admiração por um homem de grande competência profissional e política, mas também de grandes qualidades humanas.
Minha longa amizade com Tancredo Neves trouxe-me outra amizade com um grande homem público: Francisco Dornelles, seu sobrinho e pessoa de sua absoluta confiança.
Tributarista de sólida formação, acompanhou Tancredo em Minas e no Planalto, onde firmou seu conceito de seriedade e competência. A Secretaria da Receita Federal, que assumiu no começo da abertura do regime militar, foi-lhe entregue por ser o mais preparado para o cargo.
Veio a transição. Durante a construção da Aliança Democrática para viabilizar a eleição de Tancredo Neves, sua ajuda, costurando pontes e dando ao candidato um sólido suporte pessoal, foi da maior importância. Aproximando-se a vitória, surgiu como o nome natural para comandar a economia.
Quando aconteceu a tragédia que nos levou Tancredo Neves, sua postura foi decisiva como o fiador que viabilizou a cirurgia do tio: Tancredo recusava fazê-la por temer que Figueiredo não me transmitisse o governo. Dornelles lhe assegurou:
— Eu falei com o doutor Leitão e ele pediu que lhe garantisse que o Figueiredo dará posse ao Sarney.
Dornelles não havia falado com Leitão de Abreu. Mas disse que conhecia as posições dele, não havia mais clima para impedir a posse. E Tancredo então lhe disse:
— Se ele dá posse ao Sarney, então os médicos façam o que querem fazer.
Mais tarde, ao acordar da anestesia, a preocupação de Tancredo ainda é com a transição. Suas primeiras palavras:
— Então, como foi? O Sarney tomou posse? Correu tudo bem?
Assumindo a Presidência, nem pensei em mudar a nomeação feita por Tancredo. Dornelles estava preparado, eu o mantive no Ministério da Fazenda e dei-lhe o meu apoio. Compreendemos, depois de algum tempo, que a política econômica que acertara com Tancredo só era viável com ele, que tinha a legitimidade da construção da eleição e da formação do governo. Assim, em agosto, tive que aceitar seu pedido de demissão.
Ao dar posse a Dilson Funaro, disse-lhe que sucedia “ao Doutor Francisco Dornelles, a quem rendo, neste instante, a homenagem da gratidão do Governo e do Presidente pelos relevantes serviços que prestou ao País num momento difícil da vida nacional. Lamento, pessoalmente, o seu afastamento do ministério por ser meu amigo e, em nome do Governo, por ficar privado do talento e da dedicação com que desempenhou as suas funções”. Esta não era uma fórmula educada, mas a minha convicção como Presidente da República e minha convicção pessoal.
Dornelles elegeu-se deputado constituinte e desde logo mostrou que sua habilidade de articulador se estendia ao Parlamento. Fez uma grande carreira como deputado e senador, interrompida apenas para exercer mais duas vezes as funções de ministro de Estado. Vice-Governador do Rio de Janeiro, assumiu o Governo do Estado em momentos críticos, que soube superar com suas grandes virtudes políticas.
Fomos companheiros de Senado Federal por bastante tempo. Sempre encontramos maneira de colaborar um com o outro. Ali comandou várias comissões especiais, inclusive a de Reforma Política, cujo resultado, infelizmente, não progrediu na Câmara dos Deputados.
Assim, companheiros de jornada, nossa amizade se estende por muitos anos. De minha parte, minha ligação com Francisco Dornelles se baseia na admiração por um homem de grande competência profissional e política, mas também de grandes qualidades humanas, em cima das quais construímos uma confiança recíproca que se estende ao universo pessoal e familiar.
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