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COLUNA
Rogério Moreira Lima
Engenheiro e professor, foi coordenador Nacional da CCEEE/CONFEA e vice-presidente CREA-MA (2022). É membro da Academia Maranhense de Ciência e diretor de Inovação na Associação Brasileira de
Rogério Moreira Lima

As Novas Regras da Anatel: Segurança, Responsabilidade Técnica e Regulação nas Telecomunicações

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) publicou em abril a Resolução Interna nº 428/2025, que estabelece novas exigências para a continuidade da autorização de funcionamento das empresas que prestam serviços de telecomunicações de interesse colet

Rogério Moreira Lima

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) publicou em abril a Resolução Interna nº 428/2025, que estabelece novas exigências para a continuidade da autorização de funcionamento das empresas que prestam serviços de telecomunicações de interesse coletivo no Brasil. A norma, que entra em vigor em 27 de outubro, reforça o papel da engenharia e da responsabilidade técnica como pilares para a segurança nas redes de comunicação.

O principal ponto da resolução é a obrigatoriedade de comprovação da capacidade técnica das prestadoras. As empresas deverão apresentar atestados que comprovem a existência de estrutura adequada e profissionais legalmente habilitados para realizar os serviços com segurança e qualidade. Além disso, será exigido o registro ativo no CREA (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia), confirmando que a operação técnica está sob responsabilidade de engenheiros com atribuições compatíveis.

A cada dois anos, as prestadoras também deverão comprovar a implementação de programas como o Gerenciamento de Riscos (PGR) e o Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), além de fornecer EPIs e EPCs e realizar treinamentos conforme as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho. Documentos como o Atestado de Capacidade Técnica e o Resumo de Relação de Tomador de Obra (RET) também passam a ser exigidos.

O objetivo é claro, fortalecer a segurança técnica e jurídica das operações, evitando que serviços de telecomunicações sejam prestados sem respaldo profissional. Dados recentes reforçam essa preocupação.

Segundo o Anuário Estatístico de Acidentes de Origem Elétrica da ABRACOPEL – 2025, o número de mortes causadas por choques elétricos envolvendo trabalhadores de telecomunicações (internet, TV a cabo e telefonia) aumentou 525% entre 2015 e 2023. Esse grupo passou a integrar o TOP FIVE das categorias com maior número de óbitos por esse tipo de acidente no país. A criação da Fiscalização Nacional dos Provedores de Internet, determinada pela Decisão Plenária nº 1744/2021 do CONFEA, já trouxe resultados concretos: em 2024, esse percentual caiu para 200% em relação a 2015, uma queda abrupta e expressiva.

Além da nova resolução, a Anatel adotou outras medidas importantes. Uma delas foi a suspensão, por 120 dias, da dispensa de outorga para prestação do Serviço de Comunicação Multimídia (SCM), exigindo que todas as empresas regularizem sua situação. A outra foi a aprovação do Plano de Ação contra a concorrência desleal na banda larga fixa, estabelecido pela Resolução Interna Anatel nº 449, de 27 de junho de 2025. As ações miram provedores clandestinos, redes irregulares, furtos de sinal e organizações criminosas que atuam no setor.

A medida também corrige distorções regulatórias. A dispensa de outorga para pequenas prestadoras com até 5 mil acessos, prevista na Resolução nº 614/2013, cumpriu seu papel. O Brasil ultrapassou 80% de cobertura populacional com acesso à internet. Agora, a exigência de outorga para todos os provedores reforça a busca por isonomia, segurança e controle regulatório efetivo.

Mais do que uma questão técnica, as telecomunicações são hoje um tema de segurança nacional. As redes de comunicação sustentam não apenas o diálogo entre cidadãos, empresas e governo, mas também as áreas de defesa, finanças, energia, saúde e inteligência. A proteção dessas infraestruturas críticas exige rigor técnico, soberania digital e profissionais habilitados para garantir a continuidade dos serviços e a proteção de dados sensíveis.

Os equipamentos usados em telecomunicações, desde sua fabricação até a instalação em datacenters e sites, passam por uma cadeia técnica que envolve estudo, planejamento, projeto, execução e manutenção. Cada etapa exige responsabilidade técnica qualificada, especialmente nas instalações elétricas com redundância, essenciais para garantir a comunicação mesmo durante quedas de energia.

Além disso, há riscos significativos relacionados à eletricidade. Choques elétricos a partir de 30 mA (0,03 A) são suficientes para causar fibrilação cardíaca, demonstrando que níveis muito baixos de corrente elétrica podem ser fatais. Por esse motivo, desde 1997, a NBR 5410 tornou obrigatório o uso de dispositivos diferenciais residuais (DRs) de alta sensibilidade, com limiar de 30 mA, em instalações elétricas de baixa tensão, como proteção contra contato direto.

A atuação em telecomunicações também expõe trabalhadores a diversos riscos: eletricidade, altura, espaços confinados, intempéries e radiação não-ionizante. As principais normas que regulamentam essas atividades são a NR-10 (serviços em eletricidade), NR-15/Anexo 7 (radiação não ionizante), NR-16 (atividades e operações perigosas), NR-21 (trabalho a céu aberto), NR-33 (espaços confinados) e NR-35 (trabalho em altura). Todas exigem treinamento, uso de EPIs e acompanhamento técnico especializado.

Casos recentes reforçam a urgência da fiscalização. No Maranhão, acidentes fatais envolvendo redes de fibra óptica em postes da distribuidora de energia levaram à abertura de investigações por parte do CREA-MA, após denúncia veiculada pela TV Mirante. O caso resultou em auto de infração por exercício ilegal da profissão, mantido pela Câmara Especializada de Engenharia Elétrica, que determinou a comunicação formal à Anatel, à Aneel e ao Ministério Público.

Outro risco pouco visível, mas presente, é a exposição dos técnicos à radiação não-ionizante emitida por antenas e sistemas irradiantes. Ainda que não haja relação comprovada com doenças cancerígenas, o efeito térmico dessas ondas é reconhecido por entidades como o ICNIRP (Comissão Internacional de Proteção contra Radiações Não-Ionizantes) e está regulamentado no Brasil pela Resolução nº 700/2018 da Anatel. A proximidade física desses profissionais com as antenas exige atenção redobrada ao uso de EPIs, já que a EIPR (Potência Efetiva Irradiada) pode causar queimaduras, catarata e fotoenvelhecimento.

As Estações Radiobase (ERBs), fundamentais para a cobertura do serviço móvel, normalmente operam em torres entre 10 e 50 metros de altura. Até mesmo as small cells, que parecem mais discretas, costumam ser instaladas a até 12 metros do solo. Isso torna o trabalho em altura uma constante no setor.

Todo esse cenário revela um ponto central: a prestação de serviços de telecomunicações exige conhecimento técnico, preparo e respeito às leis. Leigos e profissionais não habilitados colocam em risco não apenas suas vidas, mas também a infraestrutura que sustenta a vida digital do país.

Ao exigir comprovação de capacidade técnica, responsabilidade profissional e regularidade junto ao CREA, a Anatel reforça o compromisso com a qualidade, a segurança e a valorização da engenharia. O momento é de organizar o setor, combater a informalidade e investir em fiscalização e capacitação.

O fortalecimento das telecomunicações vai além da expansão de redes e da inovação tecnológica. Trata-se de uma questão de segurança nacional, de proteção da vida dos trabalhadores e de garantia da soberania digital. Exigir responsabilidade técnica não é burocracia, é a única forma de construir uma infraestrutura sólida, resiliente e à altura dos desafios do presente e do futuro.


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Fontes

ANUÁRIO ESTATÍSTICO ABRACOPEL ACIDENTES DE ORIGEM ELÉTRICA 2025 (Ano-base 2024)

Lei nº 5.194/1966

Resolução CONFEA nº 218/1973

Resolução CONFEA nº 380/1993

Resolução Anatel nº 614/2013

Resolução Interna Anatel nº 449/2025

Resolução Interna Anatel nº 428/2025

Lei nº 9.472/1997

Sinal de internet era fornecido clandestinamente no estado do Rio – Agência Brasil. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2025-03/Sinal-de-internet-era-fornecido-clandestinamente-no-estado-do-Rio

Homem morre eletrocutado na cidade de Santa Inês – TV Mirante / Globoplay. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/8910897/

Decisão nº 60/2022-C.E.E.E./CREA-MA

Relatório Anual de Gestão 2024 – ANATEL

Decisão nº 354/2020-C.E.E.E./CREA-MA


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