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COLUNA
Gabriela Lages Veloso
Escritora, poeta, crítica literária e mestranda em Letras pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
Gabriela Lages Veloso

A ilha e o céu de Berenice

Em 2021, José Ewerton Neto publicou A ilha e o céu de Berenice, o seu terceiro romance, sendo o primeiro ambientado na cidade de São Luís.

Gabriela Lages Veloso

Atualizada em 21/03/2024 às 15h11

José Ewerton Neto é escritor e membro da Academia Maranhense de Letras. É autor de diversos livros, dentre os quais destacam-se: Cidade Aritmética e Estátua da Noite (pertencentes ao gênero poesia); os romances O ofício de matar suicidas e O menino que via o Além; a novela O entrevistador de lendas, o livro de contos Pequeno dicionário de paixões cruzadas e O ABC bem-humorado de São Luís (pertencente ao gênero crônica).

Ilustração: Bruna Lages Veloso
Ilustração: Bruna Lages Veloso

Em 2021, José Ewerton Neto publicou A ilha e o céu de Berenice, o seu terceiro romance, sendo o primeiro ambientado na cidade de São Luís. Essa obra foi imaginada a partir de uma notícia das páginas de um jornal.

A morte de um professor, por bala perdida em uma festa de estudantes, desencadeia uma série de acontecimentos, que fazem vir à tona as paixões e os sentimentos inconfessáveis dos personagens da narrativa. Vale ressaltar que a escrita desse livro foi iniciada no século passado, período no qual a trama se desenrola.

A literatura brasileira contemporânea tem se ocupado, sobretudo, com os modos de figuração da vida urbana, os embates que os sujeitos empreendem diante do lugar que vivem, transitam e, consequentemente, elaboram suas frágeis construções identitárias. Desse modo, Patrocínio (2014) propõe a tríade violência, marginalidade e realidade social, enquanto temário recorrente da ficção contemporânea.

Na tentativa de fazer um mapeamento das margens e abrir espaço para as novas vozes sociais, os escritores contemporâneos têm evidenciado percursos narrativos de personagens em trânsito e oprimidos em suas marcas de subjetivação (etnia, classe social, gênero, idade, orientação sexual). Nesse sentido, sobreleva-se o romance A ilha e o céu de Berenice (2021), tal como é possível notar no trecho a seguir:

“Notou que aquelas casas eram desprovidas de luxo mas, embora velhas, tinham resquícios de opulência vindos da memória e tempos antigos, como, aliás, eram comuns nas ruas do Centro, mas estas ostentavam, além disso, um certo ar de cumplicidade que lhes era dado pela proximidade umas com as outras. [...] Na realidade, ao subir aquelas ladeiras era como se todas aquelas casas fossem uma só e ele estivesse invadindo um corredor estreito sob olhares que convergiam por detrás dos musgos das paredes [...] as ladeiras pareciam ir e voltar com uma única intenção: drenar a presença das horas e evitar que sacudissem fortemente aquela luz noturna do passado, de melancolia e preguiça” (Neto, 2021, p. 33).

Ao longo de toda a narrativa, um ar de suspense se instaura, o que captura a atenção dos leitores e leitoras. Outro aspecto de suma importância é a linguagem utilizada pelo autor: um misto de naturalista (simples, coloquial, apresentando a realidade tal como ela é) e poética. Além do espaço urbano, também é necessário observar a construção dos personagens, desde a escolha de seus nomes.

Por exemplo, os protagonistas são o delegado Jácio e a bailarina Berenice. Jácio provém do latim jacere, que significa “manifestar suspeitas”, por isso, é um nome bem interessante para um agente da polícia responsável por liderar e supervisionar investigações criminais. Por sua vez, Berenice vem do grego Berenike, que quer dizer literalmente “portadora da vitória”, significado que também coaduna com a narrativa.

É válido enfatizar que o romance é permeado por uma série de críticas sociais. Aborda, de maneira clara e objetiva, a crueldade da pobreza e das desigualdades sociais, as diversas injustiças causadas pela corrupção e os vários abusos que as mulheres enfrentam no cotidiano: violência física, sexual e psicológica.

Portanto, A ilha e o céu de Berenice (2021) propicia um olhar mais agudo e crítico sobre a cidade e a realidade social, ao apresentar reflexões sobre o ambiente em que vivemos e construímos nossas identidades. Afinal, todos somos ilhas de anseios e expectativas.

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